“Nenhum de nós é uma simples caixa vazia para ser preenchida à base de pressões externas e condicionamentos”.
Albert Bandura
Com a pandemia da Covid-19, uma nova realidade se impôs às empresas e aos empregados e prestadores de serviços: o home office e o distanciamento social. Diversas pesquisas recentes têm mostrado que a maioria dos profissionais está com grau de estresse e de exaustão elevados no período de isolamento social. É obvio que grande parte desse efeito ocorre devido às incertezas relacionadas à saúde, à manutenção do emprego e às finanças pessoais. E, para aqueles de podem realizar suas atividades em casa, ainda existe a dificuldade de aprender a ser produtivo em um novo contexto que requer reorganização profunda da forma de trabalhar, desde o trabalho remoto, isolado e tele presencial, até a dificuldade para acessar pessoas que antes de sentavam-se a poucos metros. O que antes era automaticamente processado, agora demanda mais energia mental, algo que pode levar ao esgotamento psíquico.
Segundo Cláudio Garcia, em entrevista concedida ao jornal Valor Econômico [1], “Um dos grupos que têm sido relativamente mais impactado é o que tem entre 30 e 45 anos de idade. Aqueles que usualmente estão na fase de maior progressão na carreira. Também aquele que, neste momento, tem maior receio das despesas altas e que precisa dar atenção extra para os filhos pequenos ou pré-adolescentes sem a ajuda de escolas, creches ou babás. Além de terem pais e parentes dentro do grupo de risco, o que exige cuidado extra. A queda de produtividade para esse grupo etário tem sido notável”. Para Garcia esse grupo é justamente aquele no qual a maioria das empresas identifica seus talentos potenciais e a mudança radical no contexto laboral pode reduzir expressivamente a capacidade desses profissionais de gerar resultados. Isso não significa que não possuam habilidades e não possam ser categorizados como tal, mas simplesmente que a busca por eficiência das organizações e alteração das suas metodologias de trabalho podem prejudicar o melhor aproveitamento destes profissionais.
“Neste momento, uma das características mais preocupantes quando se fala de saúde mental é a questão do distanciamento social, a brusca quebra da rotina, e para muitos trabalhadores a possibilidade de queda da renda. Fatores que podem levar ao mal-estar psicológico”, alerta Laura Nogueira. (Laura Nogueira, psicóloga e tecnologista da Fundacentro, por Serviço de Comunicação Social da Fundacentro em 01/04/2020) [2]. “Assim, é importante que se pense em estratégias tanto na perspectiva individual quanto governamental para a prevenção da saúde mental”, completa a pesquisadora, que possui pós-doutorado em Psicologia pela Universidade Federal do Pará-UFPA e mestrado em Saúde Pública pela Fiocruz.
A montagem de um escritório em casa oferece vantagens e desvantagens, que devem ser analisadas criteriosamente observando os pontos de vista familiar, profissional e empresarial. Para quem adere a modalidade de trabalho home office, o principal atrativo é a realização do sonho, acalentado por muitos, de ser gestor do seu próprio tempo. Para as empresas os benefícios são enormes, pois há economia com empregados e encargos sociais, facilidades de mudança do ramo de atividade, em caso de insucesso, há oferecimento de produtos e serviços melhores, com custos menores e mais competitivos no mercado. O home office é gratificante do ponto de vista pessoal e vantajoso economicamente, mas pode apresentar algumas desvantagens [3].
Quando se passa a trabalhar em casa, é necessário o estabelecimento de uma nova rotina com definição clara de horários de trabalho e de outros afazeres, como descanso, atividades domésticas e de lazer. Nessa modalidade de trabalho, as pessoas precisam utilizar a tecnologia a seu favor para manter o contato social e, assim, preservar sua saúde mental, principalmente porque a flexibilidade de horário, se não for bem gerenciada, tende ocasionar sobrecarga de trabalho e maior vulnerabilidade psíquica. “Percepção de não ter tempo para nada e nem para si; sensação de impotência quanto ao não cumprimento das tarefas, sejam elas autoimpostas ou impostas por chefes, colegas e familiares; falta de reconhecimento, seja no trabalho ou trabalho doméstico, podem favorecer sentimentos de ansiedade, angústia, impotência, incapacidade, inutilidade, entre outros”, afirma a psicóloga Laura Nogueira. Segundo a psicóloga, o excesso de informações também pode ser prejudicial ao colocar as pessoas em estado de alerta constante, o que pode gerar ansiedade e angústia. Notícias falsas e sensacionalistas podem suscitar pensamentos de impotência, medo e até mesmo pânico.
Outra preocupação que deve ser observada é a falta de atualização profissional em processos gerenciais. Estando em casa, sem uma equipe, o profissional deixa de trocar experiências, como acontece costumeiramente no ambiente de trabalho com outras pessoas, havendo perigo – inclusive – de ser eliminada a figura do aprendiz ou estagiário. A modelagem como um ambiente de aprendizagem para a construção do conhecimento é essencial. É claro que o ambiente físico de trabalho facilita uma estrutura pedagógica que promove a identificação e a disseminação de ambos os conhecimentos, explícito e tácito, através do estudo e da codificação das ideias presentes nos sistemas retirados da realidade, contudo, em home office é necessário que o gestor trace estratégias que gerem engajamento e resultados não só para a empresa, mas também para o colaborador. Nesse sentido, importante voltar os olhos para a ampliação da forma de gestão de pessoas de forma virtual, bem como disponibilizar recursos e tecnológicas necessários que conduzam à liberdade de criação e execução do trabalho sem que o colaborador se sinta dependente do chefe o tempo todo.
Para que seja possível realizar a gestão de talentos deve-se focar diariamente nos desafios que os colaboradores podem ter, e não apenas na carga horária de trabalho. Alinhar reuniões coletivas, desde que produtivas, e promover o acesso amplo à informação, são desafios a serem realizados de maneira criteriosa e construtiva, principalmente, com constantes e pertinentes feedforward individuais, pois tais ferramentas – alinhadas à liderança transformacional – permitem que o colaborador mantenha foco na melhoria futura e se desenvolva cada vez mais suas habilidades.
O autoconhecimento é a premissa básica do processo de autodesenvolvimento e o alicerce das relações interpessoais. Um dos pontos mais ricos do autoconhecimento é conhecer os próprios limites e observar as próprias reações, aprendendo com elas. Em home office a possibilidade de explorar pontos fortes e aprender com o time utilizando comunicação intensa e adequada são, além de fundamentais para a excelência da própria liderança, incrivelmente recompensadores para se promover gestão de talentos e incentivar o desenvolvimento dos colaboradores. Tudo isso se revela em ideal de vida para todos os envolvidos no processo e perfeitamente adequado como oportunidade de desenvolver maior conforto e autonomia organizacional, pois o home office pode (e deve) ser utilizado como ferramenta altamente vantajosa tanto na redução dos custos quanto nos ganhos de produtividade e engajamento.
Autor: Jaime Rafael Alarcão – OAB/PR 44.118.
[1] É formado em engenharia civil com pós-graduação em gestão de negócios. Desenvolveu sua carreira em diversos segmentos como alimentos e bebidas, entretenimento e mídia, comunicação e financeiro. Trabalhou por oito anos na DBM (hoje LHH), onde ocupou a presidência para a América Latina. Atualmente, ocupa a vice-presidência executiva para estratégia e desenvolvimento corporativo da LHH, em Nova York, onde é responsável por identificar fontes de inovação e crescimento para a organização, que tem operações em 64 paises.