Em relação privada, ente público paga juros conforme previsto em contrato

Na hipótese de a administração pública fazer um negócio de Direito Privado, ela deve se sujeitar aos termos aplicáveis ao contrato. Assim, não incidem as limitações de juros e correção monetária previstas na Lei 9.494/1997.

Essa conclusão é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso especial do município de Goiânia, alvo de execução por parte de um condomínio por causa de uma taxa referente a vaga de garagem.

O caso trata da taxa condominial de um imóvel adquirido pelo ente público. Diante do atraso, o condomínio fez a cobrança aplicando juros e correção monetária, conforme convenção condominial.

Para o município de Goiânia, essas taxas não devem prevalecer porque a Lei 9.494/1997 diz, no artigo 1º-F, que incidem os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança nas condenações impostas à Fazenda Pública.

O Tribunal de Justiça de Goiás, porém, afastou a aplicação dessa norma por entender que a relação jurídica entre as partes é de natureza privada. Essa conclusão foi mantida pela 4ª Turma do STJ, por maioria de votos.

Relação privada e juros

Prevaleceu o voto divergente do ministro Raul Araújo, que foi acompanhado pelos ministros Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira.

Para Araújo, não se trata de um contrato de Direito Administrativo, em que o poder público possui supremacia contratual sobre o contratado. Com isso, não seria adequado ele se beneficiar de regras específicas aplicáveis a outras relações jurídicas.

“Quando o poder público aluga um imóvel ou efetua uma compra e venda simples, ele o faz na condição de qualquer locatário ou contratante comum, como qualquer particular, sem distinção ou diferenciação essencial”, destacou o ministro.

Assim, se o ente público faz um negócio comum, de Direito Privado, como a compra de um imóvel que integra um condomínio, deve prevalecer a cobrança da taxa condominial, na forma prevista na convenção do condomínio.

Princípio da especialidade

Ficou vencido o relator, ministro João Otávio de Noronha, que votou por dar provimento ao recurso especial do município e limitar a incidência de juros e correção monetária sobre a dívida condominial.

Em sua análise, a Lei 9.494/1997 deve prevalecer porque foi editada para padronizar os encargos de mora impostos à Fazenda Pública em condenações judiciais, o que confere previsibilidade ao negócio e preserva o equilíbrio orçamentário.

“Trata-se, portanto, de regra especial e específica, destinada a disciplinar os encargos de mora aplicáveis às condenações impostas à Fazenda Pública, devendo, portanto, prevalecer sobre disposições de caráter geral, em atenção ao princípio da especialidade.”

A decisão tem potencial para influenciar casos futuros em que entes públicos participam de negócios de direito privado, reforçando a ideia de que eles devem seguir as mesmas regras que os particulares.

REsp 1.908.924

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